Quarenta Aprovados. Quatrocentos Corações.

O despertador tocou naquela manhã, como era qualquer outro dia, mas quatrocentos jovens sequer dormiram. Em fevereiro de 2025, não era comum que o Brasil dormisse, principalmente a juventude. Mas a insônia não era provocada pelo calor do aquecimento global.

A adolescência brasileira é composta de muito mais do que cigarros eletrônicos e bebidas, afinal, naquela manhã, quatrocentas pessoas esperavam ansiosamente por uma notícia tão aguardada, envolvida de tanta luta e tanto suor.

O corpo já avisa antes de entender. As mãos de um estão molhadas de suor, o outro está tão tenso que todo seu corpo se enrijeceu e a mandíbula dói e enquanto isso mais um tremia de pânico. Havia outros que, embora a ansiedade consumisse, faziam tudo que faziam cotidianamente; tomavam café, viam rede social, escutavam música ou até dormiam.

A hora passava arrastada, dolorida. Alguns já abriam os computadores e como sempre, a página não carregava. Com muita insistência, abriam e não viam a notícia que aguardavam, mas a maioria provavelmente sequer conseguiria entrar no site no mesmo dia.

O mundo continuava, os carros ainda percorriam as ruas, motos ainda soavam estrondosas, o país ainda brigava entre quem estudaria. Em um apartamento qualquer, no centro de São Paulo, mais um se encontrava no escuro em sua cama bagunçada e pacotes de ultraprocessados jogados, clicando teclas para reiniciar a página. Ele já sabia a notícia e, depois de muito insistir, quando a viu, seu nome não estava na lista. Tentou sorrir como se conseguisse lidar, como se aquilo fosse de propósito.

Ele não chorou no dia. Nem no seguinte ou naquela semana. Era surpreendente pois todos sabiam que o resultado sairia naquela manhã e não houve comemoração alguma. Ou sequer momento dado às palavras. Os almoços calados, as paralisias, somente silêncio comunicava a dor. A rejeição doía o suficiente para que ele se calasse, o que foi suficiente para expressar o sofrimento sem palavra alguma. A palavra, por si só, era vazia, seus olhos eram atravessados, suas mãos tremiam e seu estômago revirava.

Quarenta vencedores. Nenhuma lágrima sequer.

Talvez a dor fosse grande demais para caber em lágrimas.


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